Solinftec, a start-up que quer ser o ‘Waze do agronegócio’ (e tem Luiza Trajano como sócia) | Capital

A Solinftec, agtech brasileira que tem a família de Luiza Trajano entre seus investidores, vai anunciar na manhã desta terça-feira o início de suas operações no Canadá. Com o novo escritório, na cidade de Saskatoon, a companhia chega a seu décimo primeiro país, ampliando uma plataforma que já monitora 9 milhões de hectares aplicando Internet das Coisas ao agronegócio — e quer se transformar em uma espécie de Waze das lavouras.

Além da sede em Araçatuba (SP), a agtech já tinha escritório em Cali (Colômbia) — responsável pelas operações na América Latina — e em West Lafayette (EUA). Esse último foi inaugurado em 2019, com estreia operacional no ano passado. 

A expansão na América do Norte se dá um ano depois de a família Trajano, que fez fortuna na Magazine Luiza, ter liderado um aporte de US$ 40 milhões na start-up por meio da Unbox Capital, que gere suas iniciativas de private equity. Em 2017, o americano TPG Group já havia comprado um pedaço da agtech.

Fundada por cubanos 

A Solinftec foi fundada no interior de São Paulo por um improvável grupo de sete engenheiros cubanos. Liderados por Britaldo Hernandez — hoje apelidado pelos funcionários de “Steve Jobs do agro” —, os pesquisadores acumulavam anos de pesquisa aplicada em usinas de açúcar e álcool no país natal e em visitas frequentes aos canaviais brasileiros. A experiência os convenceu de que as ineficiências do setor sucroalcooleiro se concentravam no campo e, em 2007, resolveram que a automação poderia solucioná-las — e que o Brasil seria, obviamente, seu foco inicial. Foi daí que surgiu a Solinftec.

O ano, aliás, foi um marco da convergência de tecnologias de automação, como já observou o jornalista Thomas Friedman. Foi em 2007 que surgiram, por exemplo, o iPhone; a plataforma de inteligência artificial Watson, da IBM; o Hadoop, o mais poderoso software de Big Data; e serviços de nuvem da Amazon, que proporcionam o espaço onde todas essas informações são processadas. 

A Solinftec começou oferecendo uma única solução, o copiador de solo, tecnologia que, acoplada às colhedoras de cana, medem a altura do corte independentemente das variações de terreno. Mas, dois anos depois, os cubanos receberam uma não-solicitada lição sobre negócios, inovação e concorrência: fabricantes de tratores e colhedoras como John Deere e Case IH passaram a embutir os copiadores de solo em seus equipamentos, tornando o produto da Solinftec obsoleto da noite para o dia.

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— Aprendemos ali que a máquina vai sempre evoluir e que isso cabe aos fabricantes. Começamos então a olhar para o processo, não só para a máquina. Afinal, o próprio maquinário tem que parar por questões que são, na verdade, logísticas — explica Thiago Rodrigues, que foi o primeiro funcionário da companhia e hoje é diretor operacional para América do Sul.

A Solinftec também percebeu ali que havia oportunidade no “delay” entre a inovação e sua apropriação pelas gigantes multinacionais de maquinário agrícola, conta o executivo:

— A John Deere demora dois anos para alterar uma tela. Então adotamos estratégia inversa, baseada na oferta de versões beta assim que possível e que evoluem junto com a resposta do agricultor.

‘Fila de banco’ da cana

Após aquele baque, a Solinftec focou no que Rodrigues chama de “soluções simples para problemas gigantes”, como o aprimoramento de um computador de bordo que permite ao operador do trator saber em tempo real qual é a melhor ação a se tomar. Na versão mais recente, por exemplo, o tablet que faz a interface usa reconhecimento facial e permite o apontamento de problemas por imagem, contornando as dificuldades do analfabetismo que ainda é comum no campo.

— Uma mudança simples como essa permitiu um salto enorme de eficiência — acrescenta o COO.

É o computador de bordo da colhedora que possibilitou à Solinftec lançar, já em 2011, um certificado digital sobre a origem da cana: o sistema associa a cada “lote” colhido os dados capturados in loco.

Mas a inovação que garantiu a presença da Solinftec nos canaviais, segundo Thiago Rodrigues, foi a fila única de transbordo. Trata-se de um sistema de comunicação automatizado entre colhedoras e tratores que organiza o fluxo de colheita em tempo real. A ideia é evitar que qualquer trator fique ocioso porque alguma colhedora está mais lenta que as outras. O tablet informa ao operador do trator a qual colhedora ele deve se dirigir e no momento exato — levando em conta o tempo de deslocamento — para que nenhuma etapa “engasgue”.

— Conseguimos aumentar em 1 hora e 12 minutos o tempo de corte por máquina a cada dia — afirma Rodrigues.

Expansão para outros grãos

O foco em cana-de-açúcar permitiu que a tecnologia da Solinftec abrangesse 86% da área plantada no Brasil, segundo a companhia. Sem ter para onde crescer nesse segmento, a start-up começou a olhar para grãos e perenes (café e laranja, por exemplo) a partir de 2015. Foi também nesse momento que a companhia adotou o modelo de SaaS (software as a service), em vez de vender equipamentos aos clientes.

As novas culturas apresentavam problemas diferentes, exigindo inovações que surgissem do zero. Menos relevante para a cana, o clima é determinante para a soja, por exemplo: lançar agrotóxico momentos antes de uma tempestade pode selar o fracasso de uma safra. Por isso, o principal produto da Solinftec para outras culturas é uma estação meteorológica conectada aos pulverizadores, que calcula quando e onde a aplicação do defensivo deve acontecer. 

— Nosso DNA não é gerar uma série de relatórios e mapas, aquela promessa da cultura de precisão que, para o agricultor, não serve de nada. O que ele quer é saber o que fazer naquele exato instante — observa Rodrigues, falando com a coluna por meio de uma precária conexão de internet do interior do Mato Grosso.

Hoje, a cana brasileira responde por 60% das receitas, contra 20% do grãos. Mas seu “market share” em grãos é de apenas 2%, concentrados nos grandes produtores — nove dos dez maiores grupos de soja usam suas tecnologias, segundo a companhia —, sugerindo que a cultura deve se tornar o carro-chefe em pouco tempo. 

As culturas perenes e o mercado americano representam 10% do faturamento cada um. (A Solinftec não informa dados sobre receita ou lucratividade).

‘Sistema operacional do agro’ 

Depois de ter conquistado presença na lavoura, a meta da Soliftec é dar um salto na densidade dos dados de sua plataforma, para se transformar em uma ferramenta decisória mais assertiva para o produtor rural.

— Temos acesso a uma massa enorme de dados, que coletamos de segunda a segunda desde 2007. Mas dados se tornaram commodity, não é mais um desafio. A corrida do ouro é transformá-los em informação, agregando novas camadas para sermos uma espécie de Waze para o produtor. A meta da Solinftec é ser o sistema operacional de qualquer operação agrícola — explica o COO.

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Daí a série da parcerias internacionais que a companhia anunciou nas últimas semanas. Um dos acordos foi com a Planet, que opera uma frota de 150 satélites voltados para a Terra e vai proporcionar dados em tempo real para os clientes da Solinftec. Outra parceria vai dar acesso a dados de meteorologia da Weather Company, da IBM.

Esses acordos fazem parte do plano de se tornar uma plataforma que, além das ferramentas próprias, proporciona aos produtores rurais acesso a serviços de terceiros. A ideia é que essa conversão acelere a internacionalização da start-up, explica Daniel Padrão, COO das operações da Solinftec nos EUA:

— A gente quer virar uma plataforma que agregue novos entrantes do universo das agtechs. Empresas que resolvam problemas. A ideia é facilitar que outras empresas que trabalham nos EUA possam entrar no mercado do Brasil por meio da gente, e vice-versa.

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