Os Estados Unidos voltaram a criticar a decisão brasileira de permitir que dois navios de guerra iraniana atracassem no Rio de Janeiro, ignorando um pedido americano para que o aval para a parada fosse negado. Washington, disse o chefe da diplomacia americana para assuntos do Hemisfério Ocidental, está “muito decepcionada” com a decisão, mas entende que os países “nem sempre estarão de acordo”.
Os americanos já haviam criticado a decisão brasileira, com a porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, afirmando que Brasília passou a “mensagem errada” para o mundo. O assunto, contudo, voltou à tona durante uma sessão da Comissão de Relações Exteriores do Senado dos EUA, sobre as relações bilaterais com o Brasil, que abordou temas como a influência chinesa na América Latina, a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de não mandar armas à Ucrânia e ameaças à democracia.
“Entendemos que nossos países nem sempre estarão na mesma página e o Brasil, como nação soberana, toma suas próprias decisões de política externa”, disse Nichols em sua declaração inicial. “Nós transmitimos nossa preocupação após o Brasil receber recentemente duas embarcações iranianas (…), enfatizando a repressão brutal do regime iraniano contra seu próprio povo, o fornecimento de armas à Rússia e atividades desestabilizadoras pelo mundo.”
A passagem das embarcações Iris Makran e Iris Dena, contudo, foi novamente trazida à tona pelo senador Jim Risch, principal republicano da comissão. Crítico ferrenho do presidente Joe Biden, ele afirmou que a Casa Branca deveria ter cancelado a reunião com Lula em Washington no mês passado em repúdio à atracagem e que está “perturbado” com a notícia de que o governo americano “apenas pediu para que a viagem acontecesse depois do encontro.
Risch é um crítico dos esforços de seu governo para salvar o acordo sobre o programa nuclear iraniano firmado em 2015 com China, Rússia, França, Reino Unido e Alemanha. Em troca do alívio das sanções, Teerã concordou com limites para as suas iniciativas atômicas. O ex-presidente Donald Trump, contudo, retirou Washington do pacto há cinco anos, retomando as medidas econômicas.
Desde que chegou ao poder, Biden vem tentando retomar o pacto, em negociações cujos impasses até o momento foram intransponíveis. Entre a oposição republicana, contudo, a defesa é que a política externa americana seja ainda mais dura com a República Islâmica. Perguntando por Risch sobre o que a Casa Branca pretende fazer a respeito das embarcações, Nichols disse que “os navios não têm lugar no hemisfério”.
“Os iranianos não devem estar aqui, tem um histórico horrível no que diz respeito aos direitos humanos, apoiam a guerra ilegal do [presidente russo Vladimir] Putin na Ucrânia”, disse o diplomata. “Levantamos nossas preocupações sobre sua presença com todas as nações do hemisfério, e a decisão soberana do Brasil de permitir que o Makran e o Dena atracassem em fevereiro e saíssem em 4 de março foi muito decepcionante.”
O senador, contudo, pressionou indagando se a Casa Branca não irá aplicar medidas contra o porto brasileiro e empresas que prestarem serviços às embarcações iranianas, como já havia sugerido Ted Cruz, outro senador republicano. Nichols esquivou-se de uma resposta definitiva:
“Os dois navios foram previamente sancionados, mas os EUA não discutem novas sanções antes de elas acontecerem. Nós analisaremos os fatos com cuidado daqui em diante e continuaremos a conversar com nossos parceiros no Hemisfério sobre o papel nocivo que o Irã exerce pelo mundo.”
Ucrânia e China
A resistência brasileira de enviar armamentos à Ucrânia ou aplicar sanções contra a Rússia, um dos temas-chave do encontro de Biden e Lula, também surgiu na reunião. Em seu pronunciamento inicial, Nichols ressaltou a “ênfase que o presidente Lula dá à cooperação Sul-Sul” e elogiou o voto no Brasil na Assembleia Geral da ONU no último dia 23 demandando que Moscou saia do território ucraniano.
Ao ser questionado pelo senador Ben Cardin, democrata da Califórnia, sobre quais ações Washington toma para engajar o Brasil a se posicionar de forma mais veemente a favor da Ucrânia, Nichols disse que a embaixadora americana na ONU, Linda Thomas-Greenfield, deve visitar o Brasil nas próximas semanas e que ele mesmo deverá vir ao país em breve.
“Nós trabalhamos de perto com o Brasil em assuntos de segurança alimentar e trabalhamos com eles e com outros em busca de tipos alternativos de fertilizantes importados da Rússia”, disse ele, ao ser indagado sobre a dependência brasileira dos fertilizantes russos. “Acreditamos que reduzir a necessidade de fertilizantes externos é uma forma importante de fortalecer o Brasil e limitar a influência russa no Brasil.”