O novo paradoxo da cesta competitiva

O novo paradoxo da cesta competitiva

Se antes da chegada do coronavírus os hotéis tinham seus concorrentes bem definidos, dois anos depois o cenário é bem diferente. Antes da crise sanitária, os empreendimentos corporativos competiam diretamente com propriedades do mesmo perfil. Por outro lado, o lazer disputava hóspedes de acordo com as demandas de seu público-alvo. Contudo, a pandemia embaralhou a cesta competitiva do setor, abrindo um novo leque de possibilidades em ambos os lados.

Passado o susto dos primeiros lockdowns, os hotéis expandiram seu espectro para captar demandas outrora negligenciadas como forma de recompor seus caixas bruscamente afetados. E a estratégia vem dando certo. Com as mudanças de comportamento do consumidor, adoção do modelo híbrido de trabalho e alta procura por acomodações alternativas, a hotelaria pode e deve se adaptar.

Talvez um dos nichos mais significativos de mercado na retomada, o bleisure se tornou alvo de uma fatia significativa de mercado. Alinhando lazer e negócios na mesma experiência de hospedagem, a tendência vem de encontro com o baque econômico no poder de compra da população, além de suprir parte da demanda reprimida que ainda permeia o setor.

Desta forma, hotéis corporativos passaram a olhar o lazer como um público em potencial para os finais de semana, entrando na cesta competitiva de empreendimentos que antes não estavam em suas rotas de concorrência. Já os resorts, por exemplo, entenderam que poderiam abraçar hóspedes a negócios, oferecendo espaços de trabalho ao ar livre, bem como estruturas para o homeschooling.

Análise permite decisões assertivas, diz Souza

O que é cesta competitiva?

Diante das transformações de mercado, rever a cesta competitiva faz parte de um conjunto de ações estratégicas para abranger novos segmentos e se surfar na crista da onda da retomada do turismo. Para monitorar a concorrência e tomar as melhores decisões, os hotéis precisam se atualizar frente às práticas de mercado que ditam as regras do jogo.

Em entrevista ao Hotelier News, Ricardo Souza, líder da OTA Insight na América Latina, compartilhou informações valiosas sobre como construir uma cesta competitiva assertiva. “Todos os empreendimentos, não necessariamente apenas os hotéis, dividem uma massa de demanda de perfil de clientes em um determinado período de tempo. Fatores como localização, região, tipo de produto, categoria, perfil e atratividade de marca são pontos importantes para definir sua cesta competitiva”.

Em linhas gerais, a cesta competitiva é uma ferramenta de análise mercadológica que mensura o desempenho de um grupo. Seu objetivo é acompanhar a evolução de indicadores como ocupação, RevPar e diária média, visando chegar em valores ideais de venda do produto.

“É crucial que qualquer negócio se compare com similares. Quando falamos de bens de consumo, os indicadores internos são importantes, porém a cesta competitiva é também um ponto importante para avaliar sua própria performance. Os hotéis não vivem em uma bolha, mas em um ambiente competitivo em que os clientes tomam decisões de compra baseadas em custo-benefício”, salienta Souza.

O executivo ressalta ainda que, no caso da hotelaria, a cesta competitiva também abrange outros segmentos de mercado, como o short-term rental, por exemplo.

Como montar uma cesta competitiva?

Souza explica que o primeiro passo é entender a fundo qual seu posicionamento de mercado e o que os hóspedes entendem como custo-benefício. “O hotel precisa saber o que seu público gosta e o que estão dispostos a pagar”, exemplifica. Com esses pontos definidos, é possível identificar quais concorrentes são similares ao seu produto.

Para saber qual seu posicionamento de mercado, vale a análise de alguns indicadores:

  • Índice de penetração de mercado
  • Diária média
  • Geração de receitas

“Se o hotel está localizado em uma região com muitos empreendimentos, o fator localização é um diversificador de demanda. É importante que os gestores tenham essa avaliação ao se posicionarem no mercado, sabendo de suas forças e fraquezas”, continua o executivo.

Souza afirma que o posicionamento de mercado impacta as análises comparativas e monitoramento de concorrência. “Por isso, a cesta competitiva sempre está sujeita a mudanças. Com a pandemia, a estratégia de atrair o lazer, gerando novas demandas de público, fez com que esse conceito fosse impactado”.

Cesta estática x cesta dinâmica

Antes da pandemia, trabalhar com uma cesta competitiva estática era uma estratégia comum. Ou seja, hotéis se comparavam apenas com seus concorrentes diretos e de mesmo perfil. Com os movimentos trazidos pela crise, a cesta competitiva dinâmica ganhou espaço na gestão. “Acredito mais na dinâmica do que na estática. Se os empreendimentos estão constantemente mudando seu posicionamento de mercado, em busca de expandir seu público, eles entram no radar de concorrência de produtos de perfis diversos”, continua Souza.

Uma cesta competitiva dinâmica pode ser baseada em muitos fatores, como:

  • Como o hotel está se posicionando no mercado
  • Se recebe corporativo durante a semana e lazer aos finais de semana
  • Datas comemorativas
  • Feriados
  • Categorias de apartamentos

“Se um hotel possui categorias de acomodações mais elevadas, aquele tipo de quarto pode entrar na cesta competitiva de propriedades de luxo, praticando preços mais altos. Outro ponto importante são as datas comemorativas, feriados e eventos, que normalmente também impactam diretamente o tarifário”, complementa o executivo da OTA Insight.

Durante o período de Fórmula 1, em São Paulo, ou do Rock in Rio, no Rio de Janeiro, a cesta competitiva dinâmica pode sofrer alterações. A alta procura mexe nos preços, podendo fazer com que hotéis 3 estrelas disputem hóspedes com propriedades 5 estrelas. “Acontece um movimento disruptivo dentro daquela análise de mercado, saindo do que estamos habituados”, avalia Souza.

Por fim, o paradoxo da cesta competitiva se mostra como um fator benéfico para os hotéis. O executivo acredita que empreendimentos dinâmicos têm uma capacidade de reação maior e mais rápida, pois absorvem os movimentos de mercado em tempo real. “O monitoramento me permite fazer alterações de preços estratégicas, o que oferece uma visibilidade maior sobre as mudanças, com tomadas de decisão mais assertivas”.

Com a mudança de paradigma, Souza acredita que outros fatores influenciam na demanda, variando de praça para praça. Contudo, ele afirma que não faz mais sentido para os hotéis monitorarem sempre os mesmos concorrentes na mesma cesta competitiva. “Em breve, teremos novas tecnologias para monitoramentos ainda mais dinâmicos, que tornará o processo ainda mais fácil”.

(*) Crédito da capa: stevepb

(**) Crédito da foto: Bruno Churuska/Hotelier News

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